quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Lençóis

Eu sei, já amanheceu.
Marca seis o ponteiro da hora
(aos minutos não tomo atenção)
Mas pelos que se deu,
fique mais um pouco

Vá até a cozinha
e bota a água pra ferver
Mas espere subir o aroma do café
para sair

E não tranque a porta.
Deixe eu pensar
que talvez você volte.

Aqueles dias

Onde estará o tempo
em que os versos
eram rotina?

O tempo em que
o giz de cera era brinquedo
e a ponta grossa do lápis
não se quebrava?

Naqueles dias
onde tudo se resumia
à risadas nas almofadas
e restos de argila
grudados na camiseta branca.

Onde estará aquela vida
onde tudo era certo
e o certo era sempre
aquela velha certeza?

sábado, 17 de janeiro de 2009

Rascunho do Sol

Nasce o sol
na cidade triste
em que se afogou,
na tentativa de viver
um pouco mais

A cada esquina que ela passa
sente seu mundo
se afastar um pouco mais

Tentando reerguer a vida
só tem rascunhos dos seus sonhos
no papel

Seu verbo sempre será fugir
pra onde sempre exista um pouco mais

Nasce o sol
na cidade triste em que chegou.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Portuguesinha


Ela me contava, contente com suas memórias e com aquele sotaque português que poucos entendem. Eu a entendo bem. A mulher, que nos últimos anos de sua vida, ainda se desculpa (e certas vezes se envergonha; uma vergonha bonita) das artes e impertinências de sua infância.
Não foi Chapéuzinho Vermelho, muito menos Pedro e o Lobo. Nunca ouvi vovó contar histórias para mim, que não fossem de sua infância, no colégio interno de Lisboa. Vovó não, Vovica era como eu a chamava. Por que parei de chamá-la assim?
Quando pequena, ela vinha sentar-se comigo à mesa e compartilhava suas lembranças com a neta mais nova.“Nos grudávamos no ladrilho da cozinha, as camisolas não cobriam nem metade da coxa. E devagarzinho, com os pezinhos assim ó, assim Adrianinha, a gente entrava na cozinha pra comer cacau escondido.”
Essa lembrança não é antiga. Pois ontem me deu saudades das histórias da vovó e eu fui lá passar uma tarde no chão da sala. No fim da conversa ,ela disse rapidinho, logo se levantando “Ó desculpa a conversa,viu Adrianinha.”.
De pensar que a única desculpa, era a que eu queria achar pra nunca mais sair de perto da Minha Portuguesinha.

Pedrinha

Lancei uma pedrinha no rio.
Diverti-me mais com o som da pedra adentrando a água,
do que com os círculos perfeitos que se formavam.
Passei, então, a tarde toda à beira do rio.
Ora estava agaixada colecionando pedrinhas,
ora jogando-as n'água e rindo do barulinho.
Ploft!

domingo, 11 de janeiro de 2009

À tarde

A torneira está pingando. A cada gota que cai na louça suja do almoço, ela se esforça mais para esquecer. Numa tarde quente, em que o tédio lhe faz companhia, é preciso driblar os pensamentos para não voltar àquela velha insegurança. Suas costas doem, mas nenhum lugar da casa parece menos desagradável que o sofá de dois lugares. Mais um pingo. Na estante, todos os livros se resumem à categoria de auto-ajuda, pelos menos hoje. Os programas na televisão também não ajudam. Tem farelos na colcha velha, mas ela finge não se importar. Os pensamentos voltam e ela os expulsa com uma vontade duvidosa. O som de outro pingo na cozinha. Se ao menos ela pudesse isolar todos seus sentidos, por um minuto se quer. Pingo. Mas ela não pode.Outro. Ela tenta, em vão. Um. Dois. Três pingos seguidos.Ela se levanta. Abre a torneira e toma um copo d’água. Quente. Fecha bem a torneira, cessam os pingos e ela vai pro chuveiro.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

nota

estou no carro.
parada. sentada
esperando você

você passa lá fora
e que cara de pau
finge não ver

eu te espio dia a dia
e a coragem de dizer?
falar por falar
assim não satisfaz

o que me interessa
é impressionar você